sábado, 17 de abril de 2010

O amor morre, a vida acaba

Chegou em casa depois de um dia de trabalho exaustivo. Trancou a porta e jogou o molho de chaves na mesa de centro da sala. “Amor!” Gritou a fim de anunciar a chegada ao marido. Pegou as correspondências e analisou-as uma a uma. “Amor, você pagou a conta de luz?” Perguntou. Devolveu as cartas à mesa e franziu o cenho ao receber nenhuma resposta. Andou devagar até o corredor, observou sua extensão e tentou ouvir algum ruído, mas tudo estava estranhamente silencioso. Seguiu pelo corredor até alcançar a porta de seu quarto.“Amor, está aí?” Era totalmente desnecessário, mas tocou a porta com os nós dos dedos. Sua respiração se descompassou, tinha a total certeza de que seu marido estava em casa! Não sabia o porquê, mas sentia um forte aperto no peito.
Girou a maçaneta e abriu a porta bem devagar, provocando um ruído. Deu um passo e entrou no quarto que estava vazio. Tudo estava em seu devido lugar e os raios solares refletiam na janela. Sentiu-se aliviada momentaneamente até perceber que a porta do banheiro estava fechada. Aproximou-se da porta lentamente. O barulho de seu salto batendo contra o assoalho ecoava pelo cômodo vazio. Sua respiração descompassada fazia com que seu coração palpitasse cada vez mais rápido e o temor invadisse seu corpo. “Meu amor, você está aí?” Novamente obteve o silêncio como resposta. Fechou os olhos, suspirou e abriu a porta de uma vez só. No mesmo instante o cheiro de sangue invadiu suas narinas e seu estômago revirou. Manteve os olhos fechados, mas seu corpo tremia. Não conseguia raciocinar, não conseguia pensar em motivo algum para que aquilo acontecesse! Não era necessário abrir os olhos e verificar se o corpo que jazia ali era, de fato, do seu marido. Virou-se, largando a porta aberta e correu.
Lá fora a chuva caía e os relâmpagos iluminavam o céu já escuro. As lágrimas brotaram em seus olhos e escorreram por seu rosto. Não conseguiria viver sem olhar para aquele par de olhos profundos, sem admirar aquele belo sorriso, sem tocar aquela pele tão, tão macia, sem tocar aqueles lábios bem contornados e perfeitos... Não poderia viver sem o seu amor maior! Sua vida estava provavelmente jogada no chão frio do banheiro. Acabada. Morta. Seu coração nem sentia mais dor, seu corpo estava em inércia, seus sentidos estavam confusos e sua razão completamente perdida. Correu até avistar a praia. O mar estava negro e as ondas se agitavam e lambiam a areia branca. Andou calmamente em direção ao mar. A água gelada tocou seus pés, mas não sentiu frio. Continuou caminhando, caminhando, caminhando... Até que a água tampou todo o seu corpo. As ondas a jogavam de um lado para o outro. Seus pulmões formigavam, implorando por um pouco de ar, mas tudo que conseguiram fora um jato de água gelada. Uma escuridão profunda lhe envolveu e seu coração bateu pela última vez. Estava morta como sua vida.

Caroline França

sexta-feira, 16 de abril de 2010

HÔ MEU VELHO

O seu misto de arrogância e prepotência
Não te deixa ver
O quanto ridículo você pode parecer
Hô meu velho você é grande
Mas ainda tem muito que crescer
Hô meu velho você é inteligente
Mas ainda tem muito que aprender

Pra quer se dizer o maioral?
Se achar fenomenal?
E depois ficar procurando a moral?
Para de se curar com minha ferida
De machucar o que você não acredita
Não gosto de ver você
Se engasgando com a vida
Não quero ver você
Com essa cara abatida

Será que você não consegue ver
Que você é o pai que eu sempre quis ter
Pra quer rejeitar esse amor
Que nem tão caro te custou
Não precisa tentar se firmar
Independente do que apronte a vida
Na minha você já tem vaga garantida

Hô meu velho
O sangue nem sempre tem valor nessa historia
Algumas paginas de nossas vidas
Os laços do coração dão vida própria
Hô meu velho
Não vamos desperdiçar o presente
Que o destino nos deu
Deixe eu ocupar meu lugar nesse coração
Disfarçado de ateu

Marcel Torres

Egoísmo

E quando finalmente a ultima estrela morrer estarei cega neste mundo, apenas mais um corpo nulo nas entranhas da terra, sem passado nem história, uma indigente aos olhos divinos os quais guardam tanta fé em uma obra falha, sou apenas, fui apenas mas não serei quem sonhei em ser, algo que anulasse minha sombra que guardasse minha rubra essência, meus puídos sonhos e frágeis lesões de destreza, algo único mesmo a tais olhos que planejaram toda a criação, toda vida e morte dentro de nosso conceito de mundo, quero brincar de Deus, ser a tentação de Lúcifer, quero causar a ruína, quero ser arcanjo, quero pregar minhas crenças, quero vender meus sonhos e lhe colocar em meus pesadelos, quero ser o tudo dentro de um nada, quero poder ver o desespero e o amor verdadeiro, quero um ser constituído de heterônimos, quero voar e afundar nos males de Hades, quero viver minha eternidade em um dia, quero em mim todos os sonhos do mundo, quero ser Fernando Pessoa, Chico Buarque e Carlos Drummond, quero meu singular dentro de cada plural, que teus olhos sejam minha janela.

Quero morrer dentro de cada vida que viver dentro de minha existência.

Julia Capassi